Você provavelmente ouviu a história da cegonha (ou uma de suas
versões) quando perguntou aos seus pais de onde vêm os bebês. Ou então
acreditou naquela história de que “não vai doer nadinha” na hora de tomar uma
vacina. É tudo mentira. Mas dessas você já sabia. Agora, a ciência revela que
pais mentem mais para os filhos do que imaginam. E até aquelas “mentirinhas
siceras” do dia-a-dia podem mudar para sempre a vida de uma criança. Saiba
quais são as consequências das inverdades dos seus pais e como elas moldaram
seu caráter.
1. “O vovô virou uma estrela.”
A verdade: Pais são tão criativos quanto mal-informados. Essas
historinhas criam falsas expectativas e medos desnecessários.
Adultos que têm muita dificuldade de lidar com a morte acabam por
assumir que seus filhos não vão conseguir aguentar essa dor. Aí, em vez de
contar o que aconteceu de forma clara e objetiva, tentam protegê-los com
historinhas mirabolantes. “Virou uma estrela.” “Caiu em sono profundo.” “Foi
morar no céu.” “Viajou para longe.” Tudo errado, segundo especialistas ouvidos
pela SUPER. Quando a criança não ouve respostas satisfatórias a suas dúvidas,
ela acaba procurando respostas próprias – em geral equivocadas. E essas
conclusões só tornam seus medos, suas fantasias e suas culpas ainda mais
dolorosos do que a verdade. Tentativas de comparar a morte com o sono são
desastrosas porque podem levar a criança a ter medo de dormir e nunca mais
acordar. Dizer que alguém “precisou viajar” cria a falsa expectativa de que a
qualquer momento ele vai estar de volta. O que fazer então? “O ideal é que os pais
não decidam pela criança sobre o que ela deve saber e nem deem explicações além
daquelas que a criança está procurando”, diz a psicóloga Vanessa Rodrigues de
Lima. “Viver perdas, enfrentar adversidades e sofrer frustrações faz parte do
desenvolvimento humano”, diz a psicóloga Maria Helena Pereira Franco,
coordenadora do Laboratório de Estudos e Intervenções sobre o Luto da PUC-SP.
2. “Engole o choro. No futuro,
vai me agradecer.”
A verdade: A única vantagem do castigo corporal é a obediência
imediata. No futuro, virá uma conta para o próprio filho pagar.
O chinelo é o melhor educador? Não é o que mostra a ciência. Estudos
provam que o castigo corporal não presta para ensinar o que é certo e o que é
errado - ou seja, para a criança internalizar valores morais. Na verdade,
acontece o contrário. Quando os pais castigadores estão ausentes, a criança
ignora as regras. Quando estão presentes, ela mente. Por outro lado, bater pode
criar problemas imediatos e futuros. Mesmo aos 2 anos, crianças que sofrem
castigo físico tendem a evitar seus pais. São também mais agressivas. E, mais
para a frente, têm mais risco de infringir leis, ir mal na escola e apresentar
transtornos mentais.
3. “Foi a cegonha que trouxe
você”
A verdade: Quanto menos informada sobre sexo for a criança, mais
precoce e aleatória será sua iniciação sexual – e, com isso, mais arriscada.
As primeiras perguntas pipocam naturalmente na fase dos “porquês”, lá
pelos 3 anos: a razão da diferença anatômica entre meninos e meninas e entre o
corpo deles e o de primos mais velhos – e, claro, de onde vêm os bebês. E aí
resta ser sincero, respondendo de forma clara, direta e pontual conforme as
perguntas forem surgindo. Claro, é preciso adaptar respostas à idade da
criança. “Na medida do possível, usar uma alternativa lúdica o mais próxima da
realidade da criança pode ajudar no diálogo”, diz Bombonatto. Muitos, por
exemplo, explicam que o pai plantou uma sementinha na barriga da mãe – o que
não deixa de ser verdade. E não tem por que ter medo de responder. O diálogo
franco e aberto sobre reprodução não vai estimular os filhos a fazer sexo precocemente.
Muito pelo contrário. Foi o que descobriu uma pesquisa da Universidade de
Montreal com 1 171 adolescentes de 14 a 17 anos. Deles, 45% disseram que obtêm
informações sobre sexo com os pais, e 32%, com os amigos. Entre os que
mantinham um diálogo aberto com os pais, 18% eram sexualmente ativos. Isso
subia para 37% no grupo dos que não tocavam no assunto. “Em outras palavras,
quanto mais informada for a criança, melhor ela saberá escolher o momento
certo”, diz Carmita Abdo, coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade da
Faculdade de Medicina da USP. “E, quanto menos informada, mais precoce e
aleatória será sua iniciação sexual.”
4. “Seu desenho ficou lindo.”
A verdade: Elogio exarcebado prejudica tanto quanto a crítica
sistemática.
A criança volta da escola e, cheia de si, exibe aos pais o desenho que
fez na aula. Como reagir diante daquele borrão indecifrável? “Num primeiro
momento, o pai ou a mãe até podem valorizar o que o filho fez, mas é importante
que, no futuro, façam alguns ajustes e, em vez de simplesmente elogiá-lo,
motivem o filho a melhorar”, diz o pediatra Saul Cypel, da Sociedade Brasileira
de Pediatria (SBP). Dizer que o desenho (ou o teatrinho, ou a apresentação, ou
o bolo) não ficou tão bom quanto poderia não prejudica a autoestima. Na
verdade, ajuda a desenvolver o senso crítico – e incentiva a progredir sempre.
“O elogio exacerbado pode ser tão prejudicial ao desenvolvimento da criança
quanto a crítica sistemática”, diz a educadora Tânia Zagury. Isso porque a
impede de ver a realidade e pode levá-la à acomodação.
Fonte: Superinteressante.
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