Dois estudos
decodificaram a estrutura de dois dos receptores de serotonina do cérebro. Na
imagem, um receptor conhecido como 1B, com a droga de enxaqueca ergotamina (cor
de rosa) acoplada a um de seus locais de ligação.
Pesquisadores decifraram as estruturas moleculares de dois mecanismos
chave-e-fechadura cruciais do cérebro.
As duas moléculas são receptores para o neurotransmissor natural
serotonina – que regula atividades como sono, apetite e humor – e poderiam
fornecer alvos para medicamentos futuros para combater depressão, enxaquecas ou
obesidade.
“Isso é ótimo”, declara Bryan Roth, neurofarmacologista da Escola
Médica Chapel Hill da University of North Carolina, e um dos coautores dos dois
estudos publicados em 22 de março na Science. “Antes disso não havia estrutura
cristalina para nenhum receptor de serotonina. Grande parte do que era teórico
agora é conhecido com grande nível de certeza”, observa ele.
Há anos cientistas tentam decifrar os receptores de serotonina. Com
informações do nível atômico, eles podem ser capazes de realizar avanços na
descoberta de medicamentos e na compreensão de como as estruturas físicas do
cérebro produzem a consciência, explica Roth.
Christoph Anacker, neurofarmacologista do King’s College London,
concorda que as descobertas são importantes para novos medicamentos. “Esses
receptores estão envolvidos em muitas doenças, especialmente a depressão, e
conhecer as estruturas moleculares ajudará a desenvolver medicamentos mais
específicos e evitar a expressão de efeitos colaterais indesejados”.
Mensageiros químicos
Há 14 tipos diferentes de receptores de serotonina conhecidos.
As moléculas ficam nas membranas exteriores das células nervosas;
quando medicamentos ou neurotransmissores se acoplam aos receptores do exterior
da célula, eles disparam a liberação de outros compostos químicos dentro da
célula.
Esses compostos – que podem ser diferentes dependendo do medicamento
ou neurotransmissor que os disparou – ativa mais hormônios e metabólitos,
produzindo cascatas de sinalização que são, em última análise, responsáveis por
muitos aspectos da maneira como nos sentimos, percebemos e comportamos.
Alguns medicamentos se ligam a mais de um receptor, iniciando reações
ainda não totalmente compreendidas que podem produzir efeitos colaterais
indesejados. Para evitar isso, pesquisadores querem refinar medicamentos para
que eles só ativem a rota de sinalização desejada.
Roth e seus colegas descobriram as estruturas receptoras usando
cristalografia de raios-X, em que feixes de raios-X são disparados contra
cristais do composto, e a estrutura é deduzida a partir do espalhamento dos
feixes.
As equipes se concentraram em dois receptores, chamados de 1B e 2B.
Eles descobriram que as moléculas tinham estruturas muito semelhantes nas áreas
onde a serotonina se acopla.
Mas em uma área do receptor 1B, o local de ligação era mais vasto que
no receptor 2B. Apesar de a diferença ser de meros 0,3 nanômetros, mais ou
menos do tamanho de três átomos de hélio, a diferença é suficiente para
explicar porque os dois receptores se ligam de maneira diferente a certos
compostos.
Essa distinção pode ser relevante para a segurança de medicamentos:
acredita-se que alguns remédios que ativam o receptor 2B provoquem problemas
cardíacos, e eles foram retirados do mercado por não serem seguros. A conexão
valeu ao 2B o apelido de “receptor da morte”.
Sinalização seletiva
Os pesquisadores também investigaram como diferenças em ligações
afetavam cascatas químicas.
Elas dispararam tanto o 1B e o 2B com a poderosa droga psicodélica
LSD, e um de seus precursores, um medicamento para enxaquecas chamado de
ergotamina. As drogas produziram duas cascatas químicas diferentes – proteína-G
e β-arrestina – no receptor 1B, mas apenas uma dela (β-arrestina) no receptor
2B.
De acordo com Roth, aprender a controlar as cascatas provavelmente
será crucial para maximizar os efeitos benéficos de medicamentos e minimizar
efeitos colaterais. “Em alguns casos, a sinalização de proteína-G é boa e a da
arrestina, ruim. Em outros sistemas, ocorre o contrário”, explica ele.
Anacker, no entanto, aponta que receptores de serotonina podem ter
efeitos diferentes dependendo de sua localização no cérebro, além de outros
fatores. “Seria simples demais dizer que uma cascata é benéfica e a outra,
não”, lembra ele.
Fonte: Nature.
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